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Fake news e aporofobia

E você? Já superou seu preconceito hoje? Aporofobia significa medo e ódio aos pobres, algo que tem sido bastante observado com a disseminação de fake news sobre o Bolsa Família
Cátia Guimarães - EPSJV/Fiocruz | 17/01/2022 12h11 - Atualizado em 01/07/2022 09h40

Você sabe o que é aporofobia? Pois essa palavra feia e difícil entrou na moda, para nomear um fenômeno tão lamentável quanto atual na conjuntura brasileira: significa medo e ódio aos pobres.  Mais recentemente, ela foi resgatada principalmente pelo padre Julio Lancelotti, de São Paulo, na denúncia contra grupos que espalhavam pela cidade pedidos para que não se desse esmola e comida aos moradores de rua com a justificativa de não incentivá-los na mendicância. Guardadas as devidas proporções, discurso semelhante está presente, na forma de crítica, desde a origem do Bolsa Família. E eles continuam sendo repetidos até hoje, apesar dos muitos estudos científicos que provaram o contrário. Quer ver?

QUEM RECEBE O BOLSA FAMÍLIA NÃO PROCURA EMPREGO
Vários estudos já comprovaram que isso não é verdade. Mas fiquemos apenas em dois exemplos. Em 2012, uma Avaliação de Impacto do Programa feita pelo Ministério do Desenvolvimento Social mostrou que o total de pessoas já ocupadas ou procurando trabalho era muito próximo entre os que recebiam ou não recursos do programa. Estavam nessa situação 65,3% dos beneficiários entre 19 e 55 anos, contra 70,7% daqueles que não participavam do Bolsa Família. Quando o recorte de faixa etária começava nos 30 anos, os números se igualavam, em torno de 70%. Mais recentemente, em 2021, um relatório do Banco Mundial confirmou esse dado. “O benefício do BF representa, em média, apenas um quarto da renda familiar total das famílias beneficiárias; considerando o seu baixo benefício, desde o início o programa não pretendia substituir, mas sim complementar outras fontes de renda para os pobres. Novos perfis de adultos participantes do BF em pesquisas domiciliares indicam que 70% dos adultos aptos para o trabalho no BF já estão na força de trabalho, mas sua renda é insuficiente para tirar sua família da pobreza”, diz o texto.

De acordo com Tereza Campello, estudos já evidenciaram que a “opção pelo não trabalho” aparece apenas num segmento muito pequeno dos beneficiários, formado por mulheres jovens que tiveram filho recentemente. “Até porque, no caso das mulheres pobres, fazer diferente significa voltar a trabalhar e deixar a criança desassistida, com a vizinha ou com a filha mais nova, muitas vezes colocando em risco as crianças”, diz.

QUEM RECEBE O BOLSA FAMÍLIA VAI TER MAIS FILHOS PARA GANHAR MAIS
Todos os dados sobre a realidade dos beneficiários do programa mostram o contrário. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de filhos com até 14 anos diminuiu 10,7% no Brasil entre 2003 e 2013, indicando queda na taxa de natalidade. Mas o mais importante é que esse número é ainda maior entre os 20% mais pobres do país, segmento em que estão inseridas as famílias que recebem o Bolsa Família: aqui, a redução foi de 15,7%.

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