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Há controvérsias...

Categoria de ACS e ACE está dividida, formação técnica está em xeque e piso salarial sem definição.
Ana Paula Evangelista - EPSJV/Fiocruz | 03/05/2018 13h09 - Atualizado em 01/07/2022 09h45

Tudo começou dias antes da edição da MP 827/18, quando em sessão conjunta realizada em 3 de abril, o Congresso votou pela derrubada de 13 dos 16 vetos feitos pelo presidente Michel Temer à lei 13.595/2018, conhecida como Lei Ruth Brilhante. A lei define atribuições, nível de qualificação e condições de trabalho dos ACS e ACE, e havia sido aprovada no Congresso em dezembro do ano passado. Em janeiro deste ano, foi sancionada pelo presidente da República com vetos a inúmeros de seus dispositivos. Segundo a Conacs, da qual partiu a iniciativa do projeto que originou a Lei, os vetos presidenciais haviam comprometido a “segurança jurídica” pretendida pelos ACS e ACE frente aos possíveis prejuízos resultantes da reformulação da PNAB, aprovada em agosto do ano passado.

Mesmo tendo mobilizado parlamentares suficientes para derrubar todos os vetos, os agentes comunitários de saúde desistiram de retomar três artigos. Dois deles seriam de fato extintos. Mas o terceiro, exatamente o que tratava da formação técnica, seria retomado no texto de uma Medida Provisória que seria editada pelo governo, trazendo ainda pequenos ajustes em outros trechos da lei.  A MP foi publicada no dia 23 de abril, com o nº 827/18. Mas o os termos do acordo e a avaliação sobre o seu cumprimento estão longe de ser consenso.

Formação técnica

O texto aprovado no Congresso previa a inclusão do artigo 7º-A na Lei 11.350/2006, estabelecendo que os “órgãos ou entes da administração direta dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios oferecerão curso técnico de Agente Comunitário de Saúde e de Agente de Combate às Endemias, de carga horária mínima de mil e duzentas horas”. Em entrevista ao Portal EPSJV/Fiocruz no dia 11 de abril, a presidente da Confederação Nacional dos Agentes Comunitários de Saúde (Conacs), Ilda Angélica, explicou o problema e a solução: “A redação tira a obrigatoriedade do financiamento da União, estavam lá só estados e municípios. Isso aí foi um erro da nossa parte. Os três entes federativos têm responsabilidade sobre a qualificação”. Ela explicou, no entanto, que essa questão seria contemplada por meio de uma Medida Provisória. “A MP deve trazer a questão da responsabilidade da União para o financiamento dos cursos técnicos em ACS e ACE”, garantiu.

A MP, de fato, inclui a União no financiamento da formação, porém retira qualquer referência à formação técnica, mencionando apenas os cursos de aperfeiçoamento. “Nem deu tempo de comemorar”, lamenta o presidente da Federação Nacional dos Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate às Endemias (Fenasce), Luis Cláudio Celestino. “A MP volta a intervir de forma negativa na carreira dos trabalhadores”, avalia, contando que no dia do Encontro Nacional, em Brasília, “o Temer chegou com um documento na mão alegando que já era a MP, mas não mostrou para ninguém”.  Ele acrescenta: “Classificamos como a MP do mal”.

A Conacs, no entanto, nega que o acordo tenha sido desrespeitado pelo governo. Diferente do que havia sido dito pela presidente em entrevista anterior, segundo a assessora jurídica da entidade, Elane Alves, não houve nenhuma negociação a esse respeito. “A garantia do curso técnico já está na Lei. O que foi vetado foi a ausência da União. Isso foi ponto de discussão do Ministério da Saúde, com os outros Ministérios e não houve consenso. Mas como nós já tínhamos a garantia da realização dos cursos pela Lei,  não foi necessário negociar à respeito da responsabilidade de financiamento”, afirma.

Mas, também nesse caso, não há consenso sobre essa interpretação legal e a importância da garantia dessa formação no texto da lei. A professora-pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) Marcia Valéria Morosini afirma que em nenhuma legislação brasileira, nem mesmo na Lei 11.350/2016, está estabelecido que o Estado deve ofertar a formação técnica para esses trabalhadores.  E, na avaliação da pesquisadora, a nova MP reitera o descompromisso do governo federal com a formação técnica dos ACS e ACE nas suas respectivas áreas. “Essa medida mantém a responsabilidade da União, Estados e Distrito Federal somente com a organização e o financiamento dos cursos de aperfeiçoamento que, além de serem insuficientes, não oferecem uma formação profissionalizante que possa contemplar a complexidade do trabalho e as necessidades de qualificação dos agentes. A Lei Ruth Brilhante permanece com esta lacuna histórica e prevalece, assim, o projeto equivocado de formar os agentes em técnicos de enfermagem via Profags (Programa de Formação Técnica para Agentes de Saúde)”, alerta Márcia, referindo-se ao edital do Ministério da Saúde que financia cursos técnicos de enfermagem para os ACS e ACE.

Piso salarial

Na mesma entrevista para matéria publicada no Portal EPSJV/Fiocruz antes da edição da Medida Provisória, Ilda Angélica explicou que o acordo sobre os vetos foi uma condição colocada pelo governo federal abrir negociação sobre outra pauta, reivindicada pela categoria desde pelo menos 2014: o reajuste do piso salarial. “O que a gente aguardava nessa MP do governo federal é que viesse algo relacionado ao ajuste do piso salarial. A categoria está frustrada no país inteiro”, afirma Luis Cláudio.
Para a Conacs, no entanto, essa expectativa foi um erro de interpretação de parte da categoria. “Não houve nenhuma discussão a respeito do piso. O que houve foi o entendimento de que uma vez discutindo com o governo, aceitando a permanência de três vetos e apoiando a MP, o caminho estaria aberto para a discussão do piso. É um processo de negociação que vai durar 90 dias”, explica Elane.

Ao mesmo tempo, a Conacs está articulando e apoiando a votação de três emendas parlamentares – entre as 26 apresentadas – que visam incluir a correção do piso nacional exatamente no texto da MP. A primeira Proposta de Emenda é do deputado Luiz Henrique Mandetta (DEM/MS) e amplia o piso para R$ 1.600. A segunda, assinada por Odorico Monteiro (PSB/CE), para R$ 1.402,80 com reajuste com base no INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), mais a variação do PIB (Produto Interno Bruto). O deputado Raimundo Gomes de Matos (PSDB/CE) também apresentou uma proposta que quer estabelecer o piso em R$ 1.335,60  e o reajuste anual segundo a inflação no 1º dia do mês de janeiro, de cada exercício, a partir do ano de 2019, segundo o índice de inflação adotado pelo Banco Central para elaboração de política monetária, calculado para o ano imediatamente anterior. Por fim, entre as propostas existe a iniciativa do deputado José Guimarães (PT/CE),  com piso de R$ 1.268,29, desde que haja previsão orçamentária correspondente. “Todas as propostas serão apoiadas pela categoria, porque nos darão oportunidade de colocar esse assunto em debate na Comissão Mista. Essa é a estratégia. Mas se elas serão acatadas ou se o governo irá editar uma segunda MP, isso é outra história”.

A MP será analisada agora em uma comissão mista. Depois, seguirá para votação nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado.

Comentários

Gostaria de saber quando vai ser votado a MP pra o nosso reajuste salarial

Gostaria de saber quando vai ser votado o piso salarial do auxiliar de enfermagem, pois os ACS tem piso salarial e os auxiliares de enfermagem ainda não tem .