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Políticas de Educação em disputa

Conferência Nacional Popular de Educação deve mobilizar movimentos sociais, sindicatos e entidades da sociedade civil na resistência ao desmonte da educação pública. Em ano eleitoral, expectativa é de que propostas da Conferência sirvam para pautar o debate político
André Antunes - EPSJV/Fiocruz | 03/04/2018 10h37 - Atualizado em 01/07/2022 09h45

Está marcado para acontecer no final de maio um evento que deve colocar em foco as disputas sobre os rumos da educação pública no cenário político brasileiro. Trata-se da 1ª Conferência Nacional Popular de Educação, a Conape, que ocorre entre os dias 24 e 26 de maio na cidade de Belo Horizonte. A expectativa dos organizadores é de reunir cerca de 6 mil pessoas, vindas de 25 estados e do Distrito Federal. Seu objetivo é mobilizar movimentos sociais, sindicatos e entidades da sociedade civil da área educacional em torno das metas e diretrizes estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado em 2014, bem como denunciar as medidas que têm inviabilizado o seu cumprimento. Além disso, a Conape, que ocorre pouco mais de cinco meses antes do primeiro turno das eleições de 2018, deve, segundo seus organizadores, servir para pressionar partidos e candidatos que disputarão o pleito a assumirem as propostas oriundas dos debates da conferência.

A conferência foi convocada em junho do ano passado pelo Fórum Nacional Popular de Educação (FNPE), formado por 34 entidades e movimentos sociais, e criado em resposta a duas medidas administrativas do governo federal: a alteração do calendário de realização da 3ª Conferência Nacional de Educação (Conae), que estava prevista para acontecer no primeiro semestre de 2018, e a mudança na composição do Fórum Nacional de Educação (FNE), órgão colegiado responsável pela organização da conferência oficial (saiba mais no box da página 28). Às entidades que perderam assento no FNE, como a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), juntaram-se outras organizações, como a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e a Associação Nacional pela Formação em Educação (Anfope), que saíram do FNE em solidariedade para construir um fórum e uma conferência de educação alternativos.

Tema e funcionamento da conferência

A Conape toma de empréstimo o tema, eixos, estrutura e objetivos que haviam sido estabelecidos inicialmente para a 3ª Conae, num decreto de 9 de maio de 2016, ainda no governo Dilma Rousseff, que acabou sendo revogado por um decreto executivo já sob a gestão de Michel Temer. ‘A Consolidação do Sistema Nacional de Educação – SNE e o Plano Nacional de Educação – PNE: monitoramento, avaliação e proposição de políticas para a garantia do direito à educação de qualidade social, pública, gratuita e laica’, será o tema da Conferência, dividido em oito eixos: o PNE na articulação do SNE: instituição, democratização, cooperação federativa, regime de colaboração, avaliação e regulação da educação; qualidade, avaliação e regulação das políticas educacionais; gestão democrática; democratização da educação; diversidade: democratização, direitos humanos, justiça social e inclusão; políticas intersetoriais de desenvolvimento e educação: cultura, ciência, trabalho, meio ambiente, saúde, tecnologia e inovação; valorização dos profissionais da educação; e, por fim, financiamento da educação.

Em agosto do ano passado, o FNPE disponibilizou um documento de referência, construído a partir das deliberações das reuniões do Fórum Nacional de Educação antes das medidas administrativas do Executivo que alteraram sua composição e motivaram a saída das entidades que hoje compõem o FNPE. Esse documento vem servindo de base para as deliberações das conferências livres, municipais, intermunicipais e regionais realizadas ao longo de 2017 e também das conferências estaduais e distrital, marcadas para acontecer até março de 2018, a partir do trabalho de organização dos fóruns que aderiram ao processo de construção da Conape nos estados e municípios. As discussões realizadas nas conferências preparatórias serão sistematizadas em relatórios dos fóruns permanentes de educação de cada estado, que serão então analisados por uma Comissão de Sistematização do FNPE e incorporadas ao documento-base que será votado na Conape em maio. Para constar no documento-base, as emendas devem ser aprovadas em, no mínimo, três estados. Os participantes da etapa nacional da Conape, por sua vez, dividem-se em quatro categorias: delegados eleitos por segmento (educação básica, superior e profissional) e movimentos sociais nas conferências estaduais; delegados natos, ou seja, membros titulares e suplentes do FNPE; convidados do FNPE, com direito à voz, mas sem direito a voto; e observadores, que podem participar da conferência inscrevendo-se pelo site do FNPE.

Durante a etapa nacional da conferência, cada um dos oito eixos será objeto de uma plenária específica, onde serão votadas as emendas feitas nas etapas estaduais. Na plenária final, as propostas que apresentarem posição contrária nas plenárias de eixo serão votadas, e as que obtiverem maioria simples, ou seja, mais de 50% de votos dos presentes, passam a fazer parte do documento final da Conape. “Esse documento vai nos dar condições de estabelecer uma pauta política mais robusta de defesa da educação pública, com intenção de reivindicar e comprometer os candidatos ao Congresso e ao Executivo com a educação pública e com o Plano Nacional de Educação”, aposta Andreia Gouveia, presidente da Anped. “Acho que o compromisso da Conape é de dizer: nós temos posições, temos formas de construir posições coletivas a gente quer continuar podendo debater a política pública no espaço público”, completa.

Financiamento no centro dos debates

Entre os eixos da conferência, a expectativa dos entrevistados pela Poli é de que o financiamento seja um ponto central. O documento de referência da Conape destaca que o financiamento da educação “é elemento estruturante para a organização e o funcionamento das políticas públicas educacionais e, desse modo, é essencial para que se cumpram as metas previstas na lei que aprovou o Plano Nacional de Educação”.  Os representantes das entidades que compõem o FNPE ouvidos pela reportagem são unânimes em apontar que a falta de recursos é de fato o maior obstáculo para a implementação das metas do PNE, que tem vigência até 2024. Para eles, o cumprimento da meta 20 do plano, que estabelece um aumento progressivo dos investimentos públicos em educação, passando de 7% do PIB em 2019 para 10% em 2024, é condição essencial para viabilizar o cumprimento das demais metas. Só que atualmente o país caminha na direção contrária, como diz José Marcelino Rezende Pinto, professor da Universidade de São Paulo (USP) e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca). “Pela primeira vez na história o montante global dos recursos do Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação] começou a cair em termos reais. Isso é decorrente principalmente da recessão econômica, porque o Fundeb depende essencialmente da vinculação de impostos para a educação, como o ICMS, e a receita com impostos está despencando nos estados e municípios”, afirma o professor. 

Segundo José Marcelino, tudo indica que o patamar de 7% do PIB para educação não será atingido em 2019, mesmo com a recessão econômica que reduziu em 7,2% o Produto Interno Bruto brasileiro na soma dos anos de 2015 e 2016, segundo dados do IBGE. De acordo com os dados mais recentes, de 2014, giram em torno de 5,5% do PIB para a educação. Marcelino explica que as estimativas de ampliação de recursos do Plano Nacional de Educação para chegar aos 10% do PIB estavam embasadas no aumento da participação da União. “A União fica com mais da metade da receita líquida de tributos, mas é o que menos contribui para o financiamento da educação. Só que, com a aprovação da Emenda Constitucional 95, não há possibilidade de aumento dos recursos federais”, lamenta o professor da USP. Ele ressalta que, com a emenda, os gastos com educação da União serão congelados tendo como base o ano de 2017, pior patamar da última década. “A tendência nos próximos anos é de queda dos investimentos em educação mesmo em relação ao PIB. É o pior dos mundos”, projeta.

Novo Fundeb: caminho para do CAQi

Catarina de Almeida, professora da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do Comitê DF da Campanha Nacional pelo Direito à Educação tem claro que um dos posicionamentos que devem sair da Conape é a defesa da revogação da EC 95. Ela também espera que a Conferência seja uma oportunidade de articular atores políticos na defesa de propostas que possam minorar o estrago causado pelo congelamento dos gastos da União, como a disputa por uma maior complementação da União no Fundeb, que ficou de fora do cálculo da EC 95. A Lei de Diretrizes Orçamentárias aprovada pelo Congresso Nacional para 2018 inclusive previa uma maior participação da União no Fundeb como forma de garantir o cumprimento do PNE, mas o trecho foi vetado pelo presidente Michel Temer. A Emenda Constitucional 53/2006, que criou o Fundo, estabelece que a complementação da União deve ser de, no mínimo, 10% do montante arrecadado para o fundo por estados e municípios. “Como a arrecadação desses entes está caindo por causa da recessão, o complemento da União tende a cair. A lei fala de no mínimo 10%. Mas no Brasil mínimo para saúde e educação vira máximo”, ressalta José Marcelino.

O Fundo tem vigência até 2020, o que para Catarina coloca uma oportunidade de disputar mais recursos para a complementação da União na educação básica a partir dessa data. Atualmente tramita na Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda à Constituição 15/2015, de autoria da deputada Raquel Muniz (PSD-MG) que torna o Fundeb permanente. “Hoje, para cada R$1 investido no fundo o governo federal entra com 10 centavos. Se a gente conseguisse fazer com que esse valor passasse para 50 centavos para cada R$1, a gente teria pelo menos como implementar o CAQi a partir de 2020, nos últimos quatro anos do PNE”, destaca Catarina, fazendo referência ao mecanismo criado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação para definir os valores mínimos a serem gastos por aluno para atingir uma educação de qualidade a partir da ampliação do valor repassado pela União para o Fundeb, e que de acordo com o PNE deveria ter sido implementado em 2016.

Em 2010 o Conselho Nacional de Educação aprovou resolução definindo parâmetros para implantação do CAQi, mas o documento nunca foi homologado pelo MEC. Em outubro do ano passado, a Justiça Federal derrubou uma decisão de primeira instância, julgada a partir de ação movida pela Federação dos Municípios do Estado do Maranhão, que obrigava o MEC a homologar a resolução do CNE. “O CAQi deveria ter sido implementado em 2016, mas não houve nenhum esforço. O governo Dilma enrolou o quanto pôde, e o governo Temer agora finge que não tem nada com isso.  E aí o complemento da União no Fundeb, que é o fundo que vai para mais de 40 milhões de alunos da educação básica, permanece no patamar de 0,2% do PIB. É uma contribuição ínfima”, reclama José Marcelino.

E os professores?

Outro ponto de destaque do documento de referência, segundo o coordenador do FNPE Heleno Araújo, é a questão da formação dos professores e valorização da carreira docente, que são objeto de quatro das 20 metas do PNE. Dados divulgados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) no relatório ‘Education at a Glance’, apontaram que o Brasil está entre os países que pior remunera seus docentes. Um professor em início de carreira que dá aula no ensino fundamental em escolas públicas no Brasil recebe, em média, US$10.375 por ano. Entre os 34 países membros e dez parceiros da OCDE, como o Brasil, a média salarial do professor é quase três vezes maior: US$29.411 anuais. “A dívida histórica de nosso país para com a valorização profissional dos profissionais da educação permanece e se aprofunda cada vez mais, sobretudo a partir de iniciativas de caráter conservador que limitam e desqualificam o trabalho desses profissionais”, critica o documento de referência da Conape.

Andrea Gouveia, presidente da Anped, destaca a EC 95 como uma das iniciativas que tem impactado negativamente o trabalho docente. Ela afirma que um de seus efeitos tem sido uma indução do governo federal pela adoção de medidas de congelamento de gastos no âmbito estadual e municipal, com impacto sobre as possibilidades de valorização dos profissionais. São Paulo, por exemplo, aprovou, em dezembro do ano passado, uma lei que impede o aumento das despesas do estado pelos próximos dois anos. O congelamento ameaça o reajuste dos servidores públicos estaduais, há anos sem receber sequer a correção dos salários pela inflação. Outros 19 estados já haviam aprovado leis nesse sentido como parte de um compromisso firmado no final de 2016 com o governo federal em troca da renegociação das dívidas dos estados com a União. “Isso vai gerar uma ruptura na lenta valorização dos docentes que a gente vinha acompanhando, com o comprometimento da meta 17 do PNE, por uma melhoria da remuneração dos docentes”, opina Andreia. Segundo ela, o congelamento dos gastos pode ainda contribuir para a precarização da oferta. “Muitos municípios, para poder atender a demanda pela ampliação de vagas na educação infantil num contexto de falta de recursos, têm diminuído a jornada ou mudado o perfil do profissional que atende a criança pequena. É preciso olhar para as metas e pensar como elas vão sendo ressignificadas em cada estado e município, e para isso as etapas municipais, intermunicipais e estaduais da Conape serão importantes”, destaca Andreia.

Lucília Lino, presidente da Anfope, no ‘Caderno de Debates para Avaliação das Metas do Plano Nacional de Educação’ produzido pelo Fórum Nacional Popular de Educação em preparação para a Conape, escreve que o quadro atual aponta para a precarização da carreira docente, e não sua valorização, como prega o PNE. “Após três anos de aprovação do PNE vemos o descompromisso com cada uma das 13 estratégias relativas à formação dos profissionais de educação, e ações que promovem sua desconstrução, das quais citamos, entre outras: a redução do financiamento estudantil, ao invés de sua consolidação; a descontinuidade de programas de iniciação à docência, e não sua ampliação; [...] o desmonte dos programas de formação voltados para as escolas do campo, comunidades indígenas e quilombolas e educação especial; o corte de bolsas de programas como Ciências sem Fronteiras e as Licenciaturas Internacionais”, lista Lucília.

Ela destaca ainda como ameaças para o processo formativo dos docentes da educação básica no contexto atual a “imposição” da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e da reforma do ensino médio sob o governo de Michel Temer. A primeira, escreve Lucília, impacta negativamente a formação de professores “ao impor uma lógica centralizadora nos processos educativos e de avaliações de larga escala de alunos, professores e escolas, assim como a adequação da formação aos itens da BNCC, como propõe o MEC”. A reforma do ensino médio, por sua vez, coloca em xeque a garantia da universalização da formação específica em nível superior a todos os professores da educação básica, como diz a meta 15 do PNE, ao alterar a Lei de Diretrizes e Bases e institucionalizar “o leigo (renomeado com o ‘notório saber’) como profissional da educação, caracterizando o descompromisso com a elevação da formação”, afirma a presidente da Anfope. A BNCC e a reforma do ensino médio, para Andreia Gouveia, também serão fundamentais para outra agenda que ela considera que deve ser central na Conape: o diagnóstico sobre o processo de privatização da educação no Brasil. “Por que  o governo Temer teve tanta pressa em aprovar a reforma do ensino médio e a BNCC? Nós, e o conjunto de entidades que forma o FNPE, já dissemos publicamente que há aí um conjunto de interesses de venda de material didático, de assessorias privadas, em um processo de privatização crescente da oferta educacional. Acho que essa vai ser uma agenda importante da Conape”, ressalta.

Além do PNE?

É nesse sentido, entre outros, que algumas das entidades que deverão participar da Conape esperam que a conferência vá além do que estabelece o PNE. Fabiano Faria, coordenador-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), por exemplo, considera essencial que a Conferência resgate uma bandeira defendida por entidades como o próprio Sinasefe e o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), durante a 2ª Conae, em 2014, mas que acabou ficando de fora da lei do PNE: a defesa de que os recursos públicos sejam destinados somente para a educação pública. O PNE vigente permite que os recursos destinados para a iniciativa privada por meio de programas como o Programa Universidade para Todos (ProUni), o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) sejam computados no cálculo dos 10% do PIB para a educação, o que Fabiano considera uma derrota. “Em 2014 esse foi o principal embate nosso com entidades que hoje estão no FNPE, mas que na época eram base de apoio do governo [Dilma]. E o PNE acabou aprovado do jeito que foi, em linha com a política de conciliação que o governo na época defendia. Hoje, a gente vê qual foi o resultado dessa política”, argumenta Fabiano.  E defende: “Não podemos só retomar o que tinha antes do governo Temer. A gente tem que ir além”.

Heleno Araújo, coordenador do FNPE, garante que essa questão é consenso hoje entre as entidades que participam do processo de construção da Conape. “No FNE não tinha como porque o setor privado estava dentro, e não concordava com isso. Mas as entidades do FNPE e o próprio documento da Conape já têm consenso de que o recurso público tem que ir para a escola pública”, afirma. Segundo ele, há acordo entre as entidades que compõem o FNPE também com relação à necessidade de a Conape apresentar uma reflexão crítica sobre metas do PNE que ficaram aquém do esperado. Ele dá o exemplo da meta 7, que estabelece a necessidade de se fomentar a qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades. “Só que ele mede a qualidade a partir do Ideb e do Pisa, que só avalia português e matemática, e a taxa de aprovação. Não considera outros indicadores importantes para o processo de avaliação da educação básica e superior, como os indicadores socioeconômicos dos estudantes e dos professores, a infraestrutura das escolas, etc. Então é uma meta totalmente desvirtuada, que atende ao mercado”, critica Heleno. Outra meta que ele considera inadequada é a 19, que trata da gestão democrática da educação. “Nós entendemos que o diretor de escola tem que ser eleito diretamente pela comunidade escolar, e não passar por prova, teste ou concurso público, como acontece em São Paulo, por exemplo, que foi o que acabou sendo aprovado no Congresso. Para nós ela não alcança aquilo que nós defendemos para fortalecer a gestão democrática no sistema e dentro das escolas”, diz o coordenador do FNPE.

Um racha no FNE

A Conape acontecerá cerca de um ano após a publicação de duas medidas administrativas do governo federal que serviram de estopim para que diversas entidades, como a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a Anfope e a Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae), entre outras, decidissem se retirar coletivamente do Fórum Nacional de Educação (FNE) para formar o FNPE. A decisão se deu após a publicação de um decreto executivo e de uma portaria, de número 577, nos dias 26 e 27 de abril de 2017, respectivamente. O primeiro adiou a 3ª Conferência Nacional de Educação para o segundo semestre de 2018, revogando um decreto anterior que convocava a conferência para o primeiro semestre, emitido ainda no governo Dilma Rousseff.  Já a portaria 577alterou a composição do FNE, reduzindo de 42 para 24 as entidades da sociedade civil com assento.  Ela também transferiu atribuições que eram do FNE, como a de definir a própria composição do fórum, para a Secretaria-executiva do MEC. Segundo Andrea Gouveia, presidente da Anped, a publicação das medidas foi uma reação do governo a um impasse entre o MEC e os demais representantes do FNE em relação à data de realização da 3ª Conae e também ao seu conteúdo do documento de referência da conferência. “Tivemos muitas dificuldades na interlocução com o MEC no governo Temer. Isso fez com que as entidades convocassem duas reuniões sem o Ministério. Fizemos a reunião na UnB, e deliberamos, por maioria, que continuaríamos construindo a Conae. Isso nos levou a construir o documento-referência, que foi levado para votação em fevereiro de 2017 em uma reunião a qual o MEC compareceu e votou contra”, explica Andrea. Segundo ela, foi construído um novo texto a partir do trabalho de uma comissão de negociação. Em reunião realizada em março, ele foi aprovado pela maioria do FNE, mesmo com os votos contrários dos representantes do MEC. “Nos surpreendeu quando o Ministério da Educação, à revelia do conjunto das entidades do Fórum e à revelia do regimento, dissolveu aquela composição do Fórum e o recompôs a partir de critérios que nós não sabemos quais foram”, reclama Andreia, complementando: “A forma que a gente encontrou de resistir foi organizar o FNPE e manter essa trajetória de conferências a partir da convocação da Conape”.

Procurado pela reportagem da Poli, o MEC, através da sua assessoria de imprensa, afirmou que “corrigiu distorções claras em medidas adotadas pela gestão Dilma, tanto na realização do Conae 2018 quanto na composição do Fórum Nacional de Educação, que estava sendo usado como propósito político-partidário”. Segundo o MEC, a portaria convocando a 3ª Conae para o primeiro semestre de 2018, tinha uma “clara intenção de criar uma mobilização com vistas às eleições”. Além disso, afirmou o MEC, o calendário também criava dificuldades para estados e municípios realizarem suas conferências locais antes da nacional. “O MEC, então, decidiu ampliar o prazo para até o fim de 2018. Com isso, será possível que municípios e estados cumpram suas conferências a tempo e, também, que a Conae 2018 seja realizada com maior planejamento e sem interferência político-partidária”, diz a nota enviada pelo MEC. Com relação à recomposição do FNE, o MEC afirmou que a pasta “determinou a volta da composição original do FNE e agregou representações relevantes que estavam fora, como, por exemplo, o FNDE, de modo a reforçar o papel do Fórum Nacional de Educação como espaço de interlocução entre a sociedade civil e o Estado brasileiro”.