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A difícil relação dos homens do campo com os serviços de saúde

Artigo da Trabalho, Educação e Saúde mostra dificuldades de vínculo dessa população com a atenção primária ofertada no território
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 15/01/2020 11h29 - Atualizado em 01/07/2022 09h43

Homens trabalhadores rurais ainda esperam o surgimento de problemas de saúde para procurar o SUS. Geralmente, eles chegam aos serviços de saúde devido a hipertensão arterial, dores lombares, infecções respiratórias agudas, parasitoses intestinais e acidentes com animais peçonhentos. Além disso, sua principal demanda é por assistência farmacêutica e acesso a exames especializados. Esses são alguns resultados apresentados no artigo ‘Necessidades e reivindicações de homens trabalhadores rurais frente à atenção primária à saúde’, que saiu na primeira edição de 2020 da revista Trabalho, Educação e Saúde, periódico científico da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz).

Segundo o artigo, as ações de saúde ofertadas pela atenção primária para o público masculino ainda hoje enfrentam muitos desafios para a sua efetividade, equidade e universalidade. Nessa perspectiva, os autores recomendam que as políticas públicas para a população do campo devem ser articuladas com a realidade de saúde de cada território, tendo como ponto de partida a escuta qualificada de todas as necessidades dessa população.

Toda a discussão do artigo gira em torno de um estudo qualitativo realizado entre maio e julho de 2016 na comunidade rural de Nova Minda, no município de Japonvar (MG), que fica a 535 quilômetros de Belo Horizonte. Participaram 41 homens, com idades entre 40 e 60 anos – que tinham como principal ocupação o trabalho rural há pelo menos um ano e que estivessem cadastrados na equipe de atenção básica. Os participantes trabalhavam, em média, 48 horas por semana, de segunda a sábado. Tinham rendimento de aproximadamente um salário mínimo e o ensino fundamental incompleto.

A análise dos dados secundários, que ocorreu por meio do acesso às informações dos prontuários e fichas de cadastro dos usuários na unidade de saúde, apontou que, em média, os homens faziam menos de uma consulta por ano: o número total foi de 0,08. Esses valores estão bem próximos aos encontrados nos dados do Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS) referentes ao ano de 2010, que mostram que “o número total de consultas médicas para homens entre 20 e 59 anos de idade resultou em uma média de 0,06 consulta/homem/ano”.

O artigo traz ainda outros achados: do total de entrevistados, apenas cinco estavam cadastrados nas fichas dos agentes comunitários de saúde, não possuindo prontuário aberto ou consulta médica registrada.

Em oito prontuários, havia registros médicos, "a pedido" do usuário, de exames especializados como ultrassom, endoscopia e até tomografia. Outros motivos de procura do serviço de saúde eram relacionados a atendimentos odontológicos e a busca por medicamentos e vacinação. O artigo destaca que “para os homens trabalhadores rurais, a satisfação em relação aos medicamentos vai além do seu fornecimento. Conforme alguns relatos, o aumento na variedade de medicamentos também se apresenta como uma necessidade de saúde”. Os autores alertam que a baixa variedade de medicamentos em equipes de saúde situadas em zona rural representa um grande desafio para a integralidade do cuidado.

Outras reivindicações estavam relacionadas ao  reconhecimento dos homens como usuários do serviço de saúde e à organização e desenvolvimento de grupos educativos com temáticas voltadas, especificamente, para a saúde do homem. Ao mesmo tempo, o estudo verificou um baixo comparecimento dos homens aos grupos de educação em saúde desenvolvidos pela equipe que atendia a comunidade. No período de julho de 2015 a julho de 2016, estiveram presentes três homens nessas atividades – e apenas um era participante do estudo.

O artigo conclui que é necesário promover incentivos ao homem rural para que ele possa comparecer, preventivamente, às unidades de saúde e construir um vínculo que gere adesão às atividades educativas. “Observamos uma valorização do modelo assistencial curativista e a contribuição positiva das reivindicações dos homens para o fortalecimento dos movimentos de luta pelo direito social à saúde”, dizem os autores Sérgio Vinícius Cardoso de Miranda, Pâmela Scarlatt Durães Oliveira, Virlady Cardoso de Miranda Moraes e Luiz Carlos Fadel de Vasconcellos.

Veja o periódico na íntegra.